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terça-feira, 5 de junho de 2012

Kohlberg e o desenvolvimento moral

Como surgiu esta teoria?



A fonte original da definição dos estádios de desenvolvimento moral foi o levantamento de dados realizado por Kohlberg junto a 75 rapazes, divididos em três grupos etários de 10, 13 e 16 anos. Neste estudo, seguindo o desenvolvimento em intervalos de 3 em 3 anos, utilizando o método de entrevistas inspirado em Piaget, o investigador apresentou aos sujeitos, dilemas morais hipotéticos, para serem analisados um de cada vez. Cada sujeito era solicitado a julgar os dilemas e apresentar justificações para as respostas apresentadas. Nesse processo, o entrevistador tinha o cuidado de procurar deixar o sujeito à vontade para responder livremente e de fazer perguntas, procurando respostas adicionais, para maior esclarecimento quanto às justificações. Esse estudo permitiu chegar á conclusão de que há tendências etárias quanto ao uso de tipos de raciocínio moral exibido nas respostas e verificar um conjunto de aspectos do julgamento moral.

A partir da análise das respostas e dos raciocínios apresentados pelos sujeitos, Kohlberg definiu estádios de desenvolvimento moral.



Eis um exemplo de um dilema:

"Numa cidade da Europa, uma mulher estava a morrer de cancro. Um medicamento descoberto recentemente por um farmacêutico dessa cidade podia salvar-lhe a vida. A descoberta desse medicamento tinha custado muito dinheiro ao farmacêutico, que agora pedia dez vezes mais por uma pequena porção desse remédio. Heinz, o marido da mulher que estava a morrer, foi ter com as pessoas suas conhecidas para lhe emprestarem o dinheiro pedido pelo farmacêutico. Foi ter, então com ele, contou-lhe que a sua mulher estava a morrer e pediu-lhe para o deixar levar o medicamento mais barato. Em alternativa, pediu-lhe para o deixar levar o medicamento, pagando mais tarde a metade do dinheiro que ainda lhe faltava. O farmacêutico respondeu que não, que tinha descoberto o medicamento e que queria ganhar dinheiro com a sua descoberta. Heinz, que tinha feito tudo ao seu alcance para comprar o medicamento, ficou desesperado e estava a pensar assaltar a farmácia e roubar o medicamento para a sua mulher. Deve Heinz assaltar a farmácia para roubar o medicamento para salvar a sua mulher? E deveria Heinz assaltar a farmácia para roubar o medicamento para salvar a vida de um desconhecido?"

 Com base nos dilemas que propôs, Kohlberg propôs uma teoria segundo a qual o desenvolvimento moral se processa a partir de três níveis de raciocínio moral, cada um deles subdividido em dois estádios, perfazendo um total de seis estádios.

NÍVEL 1: MORALIDADE PRÉ-CONVENCIONAL 

(crianças até aos 9 anos, bem como alguns adolescentes e grande número de delinquentes)

Neste nível, o indivíduo raciocina em relação a si mesmo e ainda não compreendeu ou integrou totalmente as regras e expectativas sociais.

A moralidade (as regras e normas sociais) é completamente externa ao sujeito – a criança conforma-se às regras impostas pelas figuras de autoridade para evitar a punição ou para obter recompensas pessoais (isto é, para “ajuizar” acerca das acções, o sujeito centra-se nas consequências físicas e hedonistas[punição/recompensa], ou no poder de quem as enuncia).



Estádio 1: Orientação para a punição e obediência.

No estádio 1, o certo é a obediência cega às regras e à autoridade, de forma a evitar a punição. O que está certo é evitar a violação das regras e evitar danos físicos aos outros e à propriedade. As razões para fazer o que está certo é evitarem a punição e os castigos.

Estádio 2: Individualismo e troca instrumental.
No estádio 2, o certo é a satisfação das nossas necessidades e interesses. O que está certo é seguir as regras quando elas nos servem e deixar os outros fazerem o mesmo. Neste estádio, a criança reconhece que os outros também têm interesses. A criança, neste estádio, assume uma perspectiva concreta individualista. Separa os seus interesses dos interesses dos outros. Os conflitos de interesses resolvem-se dando a todos uma parte igual.

NÍVEL 2: MORALIDADE CONVENCIONAL

(a maior parte dos adolescentes e adultos; a maior parte das pessoas fica aqui, não avança mais)

Já há interiorização e adopção (como suas) das regras morais. A moralidade é definida por actos que são bons porque mantêm a ordem social convencional. O sujeito concebe as exigências da família, da escola, do grupo social como constituindo valores em si mesmos, independentemente das consequências. Identifica-se com as pessoas ou grupos que garantem as normas e esforça-se por obedecer às regras estabelecidas por outros, de forma a obter louvor e reconhecimento pelo seu comportamento correcto e para manter a ordem social. O indivíduo considera correcto aquilo que está conforme e que respeita as regras, as expectativas e as convenções da sociedade.



Estádio 3: Expectativas interpessoais mútuas, relacionamento e conformidade interpessoal.

No estádio 3, o certo é ser simpático, leal e digno de confiança. O que está certo é viver de acordo com aquilo que os outros esperam de nós e fazer aquilo que os outros esperam que nós façamos. Este estádio tem em conta tanto a perspectiva do indivíduo como a perspectiva dos outros. Uma pessoa, neste estádio, sabe partilhar sentimentos e sabe relacionar diferentes pontos de vista em simultâneo. É capaz de "calçar os sapatos dos outros", isto é, sabe colocar-se no papel dos outros.


Estádio 4: Sistema e consciência social, manutenção da lei e da ordem.
No estádio 4, o certo é cumprir o dever para com a sociedade, manter a ordem social e velar pelo bem-estar de todos. A razão para fazer o que está certo é ajudar a manter a ordem social e o bom funcionamento das instituições. Este estádio distingue os pontos de vista da sociedade dos pontos de vista dos grupos e dos indivíduos. Uma pessoa neste estádio assume o ponto de vista do sistema e considera as relações interpessoais em termos do seu lugar no sistema.

NÍVEL 3: MORALIDADE PÓS-CONVENCIONAL

(só alguns adultos, a minoria dos adultos)

A este nível o indivíduo está comprometido com um  conjunto de princípios morais complexos e abrangentes, e que são muitas vezes partilhados com outros; ou seja, consideram-se sempre diversos pontos de vista e cada situação é pensada de modo a extrair-se princípios gerais (para todos). Admite-se que não existem soluções fáceis para os problemas humanos e morais.

De facto, os princípios morais podem transcender figuras de autoridade ou até as normas ou valores de uma sociedade particular. Um indivíduo situado neste nível compreende e aceita as regras da sociedade na sua globalidade, mas apenas porque primeiramente aceita determinados princípios morais gerais que lhe estão subjacentes. No caso de um desses princípios entrar em conflito com as regras da sociedade, o indivíduo julgará com base nesse princípio e não na convenção social. Por outras palavras, os princípios morais são internalizados e tornam-se individualizados.



Estádio 5.

No estádio 5, a escolha moral é baseada nos direitos básicos, nos contratos legais e nos valores morais, mesmo quando há conflito com as leis ou as regras do grupo. O que está certo é ter consciência que as pessoas nem sempre partilham os mesmos valores e que, por vezes, as leis e as regras do grupo são injustas e não merecem, portanto, ser obedecidas. A razão para fazer o que está certo reside na necessidade de respeitar os contratos e os direitos dos outros. Neste estádio, a pessoa toma decisões na base do maior bem para o maior número. Neste estádio, há verdades mais importantes que os interesses da sociedade. A pessoa, neste estádio, considera o ponto de vista legal e o ponto de vista dos outros e procura reconhecer o conflito entre eles, de forma a fazer escolhas que tragam o maior bem para o maior número.



Estádio 6: Princípios éticos universais (não necessariamente escritos).
No estádio 6, o certo é o que obedece aos princípios éticos universais. As leis ou os contratos e acordos sociais são válidos sempre que respeitam esses princípios. A razão para fazer o que está certo é que a pessoa reconhece a validade dos princípios e procura cumpri-los.

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